Meu pai era um democrata. Ele me permitiu escolher o time do coração. Mas impôs uma única condição: esse time tinha que ter sede na Gávea e jogar com o “Manto Sagrado” vermelho e preto.
Após todos esses anos torcendo pelo rubro-negro da Gávea, eu sou muito grato ao meu pai, pois sou um feliz torcedor do maior clube do mundo, o Clube de Regatas do Flamengo.
Fato é que milhões de brasileiros têm a mesma condição, no entanto me considero um privilegiado, pois pude acompanhar de perto a trajetória do maior time que o Flamengo já teve na sua história e, principalmente, do seu maior ídolo, Zico.
Eu ia a todos os jogos do Flamengo, claro, mas não satisfeito também ia aos treinos. Nessa época, eu trabalhava no Jornal O Globo.
De tanto ir a treino, conhecia todo mundo. Do presidente ao ropeiro. Do goleiro ao ponta esquerda. Eu falava com todos, tal era a minha paixão, e tinha um ambiente maravilhoso na Gávea.
A Gávea era minha casa. O Maracanã era o meu parque de diversões.
Em 1978 eu não sabia, mas aquele grupo ia fazer história. E que história! A começar pelo gol do Deus da Raça, Rondinelli aos 43 minutos do segundo tempo daquele jogo decisivo contra o Vasco.
No meio daquele grupo, Ele, o nosso Deus, Zico. Que sorte a minha ter conhecido ele, ter visto ele jogar e ter assistido de perto ele construir a sua história fantástica de ídolo maior da maior nação do Brasil e do mundo.
Mas Zico não era apenas um jogador fora de série. Zico era (e é) um ser humano fora de série. Eu ali, ainda estagiário, querendo papo, e ele, o maior ídolo do clube, quando me via, gritava: “fala figura!”. Realmente dá arrepio só de lembrar.
O melhor jogador do Flamengo também era o último jogador a sair do campo de treino. Acabava o treino, os jogadores seguiam para o vestiário e o nosso ídolo fazia hora-extra, treinando cobranças de falta. E ficava até escurecer! Impressionante o amor do Zico pelo Flamengo, pela sua profissão e pela Nação Rubro-Negra!
No Maracanã, o nosso ídolo maior entrava sempre com disposição e liderava o time rumo a vitória com o mesmo entusiasmo, fosse contra o Fluminense, fosse contra o Madureira. Ele era sempre igual. Jogava uma barbaridade, fazia gols, dava assistência, iniciava contra ataque com aqueles lançamentos de 40 metros, batia corner, enfim, o cara infernizava o time adversário!
Mas Zico nunca fazia pouco do adversário, sempre foi humilde e respeitou o mais duro dos zagueiros que teve pela frente.
Zico era a representação da alma rubro-negra!
E o Maracanã fervia nessa época. Lembro que certa vez saí atrasado da PUC, onde estudava, numa quinta-feira chuvosa para ver Flamengo x Goitacaz às 21hs. Quase não chego a tempo de ver o pontapé inicial. E sabe qual foi o público desse jogo em plena quinta-feira com muita chuva? 30 mil pessoas! (sem contar, claro, com os “não pagantes”).
Dessa época em diante trilhei um caminho que poucos conseguiram. Vi TODOS os títulos brasileiros do Flamengo no estádio. Eu estava lá nos SEIS títulos, começando por aquele antológico Flamengo 3 x 2 Atlético-MG e terminando por aquele jogo contra o Grêmio em 2009, ambos no Maracanã.
Zico sempre me deu muita alegria dentro de campo. E certa vez, no Brasileiro de 1987, ele se machucou e foi substituído no meio do segundo tempo. Quando acabou o jogo, eu peguei o elevador das cadeiras especiais, e fui esperar o Leonardo lá embaixo. Leonardo era um menino nessa época, tinha 17 anos, então nem tinha carteira de motorista e sempre voltava para casa comigo (isso é outra história que conto outro dia).
Estava eu lá embaixo, na saída das cadeiras especiais esperando o Léo quando vi que Zico saia da garagem com um bando de gente cercando o seu carro. Ele mal conseguia mover o carro de tanta gente, mas teve uma hora que os seguranças afastaram os torcedores e ele arrancou. Alguns torcedores ainda correram atrás, mas ele acelerou para se livrar daquilo, e veio na minha direção. Eu esperava que ele fosse passar na minha frente e seguir em frente, mas quando chegou perto de mim freou, abriu a janela e perguntou: “vai pra onde, figura?”. Eu disse que esperava o Léo. Ele deu um sorriso, perguntou se eu tinha gostado do jogo e na minha afirmativa, me mandou um abraço e seguiu o rumo dele. Eu fiquei ali, pensando o que era aquele cara que, apesar de ser meu ídolo, e ídolo maior daquela massa, se dirigia a mim como se fosse uma pessoa comum.
Esse era Zico, o cara não era só o melhor jogador, era o melhor ser humano do Clube.
Pensando bem, para ser o ídolo que é, da maior torcida do mundo, tinha que ser mesmo um ser humano muito especial.
Zico é isso. Um ídolo, um mito, mas acima de tudo um ser humano extraordinário.
E eu sou um felizardo, um dos poucos que pôde acompanhar de perto a trajetória dele e do Flamengo nos seus melhores tempos. E continuo acompanhando o Mengão, e ainda verei muitos e muitos títulos! Sempre no estádio nas decisões.
Saudações Rubro-Negras!
Fabiano Marinho
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