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quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

O Vilão da Vez




Diante dos últimos fatos no Brasil (mensalão, manifestações, prisões, homofobia), virou moda um monte de gente opinar sobre tudo. A internet se transformou numa espécie de fórum permanente de falsos especialistas. Daí virou moda ser contestador. Agora reclamam do calor, quando começar a chover, reclamarão das chuvas, enfim, quando o inverno chegar, ficarão com saudades das altas temperaturas do verão.

O futebol não fica isento desses modismos, e acaba por reproduzir todas as mazelas de nossa sociedade. Com um agravante, as opiniões derivam de resultados pontuais, e ficam subordinadas ao passionalismo da ocasião. A Torcida do Flamengo, até mesmo pelo seu tamanho, exemplifica bem essa reação cega pela paixão.

Somos 47 milhões de técnicos, sem especializações, preparação, conhecimento de causa, onde a grande maioria não tem o mínimo de habilidade com a pelota, mas se acham bem mais capacitados que o Jayme de Almeida para escalar o time do Flamengo.

Para piorar a coisa, todo ano repetimos o mantra de que “o Campeonato Carioca não vale nada”. Todavia, basta rolar a bola nesta competição para os profetas do apocalipse aparecerem com suas previsões catastróficas. Obviamente que não queremos ver nosso time perder nem jogo treino, mas há que se dar a devida importância para cada competição.

O Campeonato Carioca tem seu charme, sua história, mantém acesa as chamas dos times que, eventualmente caem para as divisões subalternas mas, a bem da verdade, possui uma fórmula ultrapassada, deficitária, tudo agravado com a marcação de horários estranhos para que consigamos ver todos os jogos.

Se existe um lugar bom para avaliar atleta de futebol é justamente a competição regional. Vejamos por exemplo o Cruzeiro de 2013. Marcelo Oliveira definitivamente montou a equipe que ganhou o brasileiro com relativa facilidade justamente no fraquíssimo Campeonato Mineiro. Até com certa lógica, seu time chegou em primeiro na fase de classificação, perdendo um único jogo apenas  na decisão para o rival Atlético, que já era uma equipe pronta por Cuca.

Enfatizo que os dois treinadores citados levaram suas equipes a conquistas relevantes na temporada de  2013. Ambos tiveram tempo para trabalhar e conheciam seus jogadores. Para entender a amplitude do trabalho dessa duas equipes, basta recordarmos em que parte da tabela do Brasileirão ambas estavam em 2011...

O problema é que nós meio que acostumamos a ver o Flamengo pós década de 80 a obter conquistas na base do improviso. Ocorre que os tempos são outros. Nenhuma equipe de futebol no Brasil conseguirá se estabelecer e se desenvolver sem uma gestão que consiga equilibrar as receitas. Os tempos de contratar e não pagar, por exemplo, ficaram para trás. E o Flamengo de Bandeira de Melo já deu mostras disso.

Mas as benesses não são enxergadas facilmente, principalmente em um País onde a leitura e a visão crítica são substituídas pelas versões fictícias apresentadas nas novelas, pelas retóricas dos políticos, e pelo oportunismo de algumas âncoras do jornalismo midiático.

Jayme de Almeida foi um achado para o Flamengo. Conhece intimamente os bastidores do Clube, possui excelente cultura de futebol, tanto do ponto de vista empírico como teórico (sim, Jayme tem formação acadêmica especializada). Vivenciou a transição de treinadores desde a última passagem de Wanderley Luxemburgo, e assumiu o Flamengo sempre sabendo o que fazer.

Devido ao inconsciente coletivo, Jayme tem ficado à deriva de forma muito parecida com a qual foram expostos Carlinhos e Andrade no comando do time de futebol do Flamengo, com uma diferença: Jayme demonstra que estava preparado para assumir a responsabilidade de liderar o elenco do Flamengo. Jayme de Almeida, mesmo nos momentos em que assumiu interinamente o Flamengo, jamais se comportou como interino. A maior prova disso foi a escalação do menino Samir contra o Criciúma, logo após a saída de Jorginho.

Uma das premissas para ter um time competitivo é possuir uma escalação básica, com peças no elenco capazes de manter rendimento semelhante quando chamados. Há que se formar mais que um time. Necessitamos de um grupo focado nos mesmos objetivos.

Nesta lógica, Carlos Eduardo e Val, por exemplo, não podem se queixar de ausência de chances para jogar. Val já foi dispensado e Cadu não deverá passar de junho. Mesmo assim, até lá, o Flamengo não poderá deixar de quitar um dos maiores salários da equipe.

Não obstante a gulodice dos portugueses para com o Elias, e a completa falta de noção de Luiz Antonio, jogadores como Everton, Léo, Mugni, Erazo, e até mesmo Alecsandro chegaram com status de reforço. Especificamente Erazo foi contratado pelo futebol que apresentou no Barcelona de Guaiaquil e na seleção Equatoriana.

Por absoluta falta do que dizer, e imediatamente após as duas exibições nada satisfatórias de Erazo no Flamengo, logo surgiu o pior argumento para refutar a performance do equatoriano, a de que nunca existiram jogadores relevantes no Equador. Será que pensam que Alex Aguinaga, Agustin Delgado, Eduardo Hurtado, Jefferson Monteiro, Édison Méndez, Edmundo Zura e Carlos Tenório são colombianos?

Eu cheguei a ser alvo de chacota, pois alegam que eu disse que Erazo era craque, coisa que duvido, pois é um termo para o qual sou muito exigente em termos futebolísticos para chamar alguém. Mas eu acredito que eu tenha dito exatamente o que penso: Erazo é um bom jogador, mas não sei como se comportará com o Manto Sagrado. Afinal, essa camisa pesou para muitos que se destacaram em outras equipes, pois, como falou Miguezinho Gaúcho, “Flamengo é Flamengo!”.

Na era Jayme de Almeida, além dele próprio, os já citados Val e Cadu foram vilões. Após o Fla-Flu, Erazo foi crucificado por suas falhas, e logo rotulado como “fraco”. Sua escalação foi duramente criticada pelos profetas do passado, que sequer prestaram atenção nas palavras justificativas de nosso treinador no dia anterior, onde dizia que precisava ver o atleta em campo contra um adversário de expressão. Ninguém queria perder para o Fluminese. Mas o jogo valia pouco diante da importância de nossa estreia na Libertadores.

Jayme tinha esperanças de poder contar com o futebol daquele Erazo do Barcelona e do Equador contra o Leon, mas o Fla-Flu demonstrou que isso seria temerário. Fomos então de Samir e Wallace, comprovadamente uma boa zaga, mas que falharam ontem no segundo gol dos mexicanos. Porém, a surpresa maior seria a escalação de Cáceres, cuja temporada 2013 foi bastante aquém das expectativas. Mas na partida contra o Leon, vimos em campo um paraguaio que definitivamente sabe como se comportar em uma competição como a Libertadores.

No mais, ninguém esperava que o pitbull Amaral fosse azedar o leite logo de cara. Para a magnética, até o perdão de Jayme após a partida é inaceitável. Afinal, há que se explicar a derrota de alguma forma. O que vi de gente antes da partida achando que o Flamengo venceria fácil, só aumenta a revolta para com o nosso volante que, dois meses atrás se consagrava como um dos principais responsáveis pela conquista da Copa do Brasil.


Mas Amaral isoladamente seria pouco para justificar o placar. Eis que surge um novo e maior vilão: Mister Bean, um cara esquisito e literalmente um reles soprador de apito. Mas, por favor, não há como reclamar das conhecidas arbitragens latinas. Principalmente eu, que sou um rubro-negro forjado no histórico Real Madrid 1x2 Flamengo (C.R. Flamengo 2 x 1 Real Madrid (ESP) Troféu Palma de Mallorca 19/08/1978),  quando tivemos 3 jogadores e todo o banco de reservas expulsos – falarei detalhadamente sobre esse jogo em outra ocasião.



O Mister Bean só não será o vilão dos vilões por que, ao mesmo tempo em que deixávamos três pontos no México, outro time brasileiro sofria uma derrota irreparável. O Cruzeiro teve um prejuízo maior que a perda de pontos. O time e sua torcida tiveram que aturar uma das coisas mais repugnantes do mundo: demonstrações de racismo. Nem preciso entrar em detalhes, pois todos viram a vergonha protagonizada por um bando de torcedores peruanos idiotas pela TV. Mas quero aproveitar para chamar os nobres rubro-negros para uma reflexão. Aqui no Brasil, não lá no Peru, mas aqui mesmo em nossa terra, uma pesquisa demonstrou que 87% da população brasileira acredita que exista racismo em nosso País. O assombroso foi a mesma pesquisa constatar que apenas 4% se consideram racistas. 
Será que pode existir racismo sem racistas? Ocorre que o racismo não é a opressão de um homem sobre o outro, mas sim a construção de preconceitos, pensamentos e atos racistas da sociedade sobre os homens. O racismo existe por que sobrevive sob a nossa passividade diante do tema. Espero que essa lamentável ofensa ao jogador Tinga nos sirva para dar um basta em nossa inconsciente conivência cotidiana, que ainda permite atos e fatos tão desprezíveis.

Cordiais Saudações Rubro-Negras!
Ricardo Martins é membro da Embaixada Fla BH

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